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Mugler Spring Summer 2021 Part 02: a tomada transgressiva de Thierry Mugler
O convite para a apresentação da nova coleção do designer francês Thierry Mugler – que se lançou com a primeira marca, Café de Paris, em 1973 – foi feito através do vídeo Mugler Spring Summer 2021 Part 02. O vídeo abre em plena escuridão com uma jovem atlética de top e calças jeans justas, sendo lançada no espaço pelo diretor criativo da marca, Casey Cadwallader. Como um divertimento (e/ou simbologia), com a música ironicamente repetindo "you want to go slow" (você que ir devagar), e Bella Hadid tentando se equilibrar no ar. Com as calças de dupla face, dois eventuais materiais e duas cores que se evidenciam no escuro, desenhando os músculos do corpo de Hadid. Como um modelo nu numa aula de anatomia. É também numa cambalhota que o designer americano lança ao ar a modelo de ascendência palestina e o show começa numa dança aerodinâmica.
A coleção captura o DNA da maison numa mistura de alta tecnologia robótica e escultura chique. Tal como prova o referido vídeo de sete minutos, que foi revelado na noite de quarta-feira (31 de março), e onde se distingue num primeiro plano Casey Cadwallader, o diretor criativo da Mugler desde dezembro de 2017, abraçando Bella Hadid e projetando-a como um tiro de canhão com tudo o que este gesto possa insinuar e mesmo simbolizar.
Também em destaque no desfile estão a russa Irina Shayk, a sul-sudanesa Alek Wek e a asiático-americana sempre loura Soo Joo Park, que tal como Hadid tanto avançam como recuam no espaço vazio escurecido. Passeiam os looks de Casey Cadwallader para a Mugler, exibindo os seios que sugerem uma nudez escondida por tecido à cor da pele e movimentando os quadris numa atitude provocadora: tops recortados com técnica, entrelaçando-se no peito, ombros, pescoço, costas e braços; calças jeans elásticas com várias costuras e demarcações; uso extensivo de tecidos, blusas e boleros; abuso de cortes, recortes e collants de riscas. Enfim, a silhueta de uma super heroína de cabeça descoberta com uma áurea de guerreira espacial.
Pisando disparadas no vazio de uma escuridão, jogando com vários looks que ora assumem o corpo desnudo ora transparências fingidas, as modelos dançam entre a emoção e a ferocidade. Num movimento reto que logo vira em direção inversa, no vídeo de enaltecimento aos corpos dirigido pelo diretor do filme Torso (1973), Sergio Martino.
Tal como ditava o fundador da maison, a moda de Cadwallader requer um corpo em perfeita forma física para que a roupa sensual funcione.
Assim como no vídeo anterior da Mugler, Part 01, a trilha sonora apresentava a londrina Shygirl. A Part 01 do vídeo abriu com um avatar, baseado em Bella Hadid, vestida com um top recortado e calças tão apertadas que ela mal conseguia caminhar por um lago de faz-de-conta.
Num cenário digno de um dos sonhos mais felizes do pintor surrealista Chirico; na realidade, o distrito pós-modernista Noisy-le-Grand situa-se um ponto na autoestrada a caminho da Euro Disney, a leste de Paris. Um elenco inclusivo, agressivo e escultural, posa diante da escultura urbana e do famoso edifício central vertical de Camembert, desenhado por Manuel Nunez Yanowsky. Craftily surreal, o elenco acabou por se transformar em gigantes que acariciam monumentos parisienses, num vídeo dirigido por Florian Joahn. O avatar torna-se mesmo um centauro virtual, ou melhor, uma amazona, no Palais de Chaillot do Trocadéro.
O fundador da maison ficou famoso pelo seu livro icônico, Thierry Mugler, Photographer (1988), que apresentava valquírias empoleiradas a meio dos sete grandes arranha-céus de Moscovo, denominados Sete Irmãs, que Estaline mandou construir de 1947 a 1953, para expressar a ambição soviética.
Thierry Mugler, para seu crédito, foi um dos primeiros designers abertamente rendido a gays super estrelas, que teve a coragem de usar travestis e transexuais nos seus espectáculos muito antes do próprio termo "LGBT" ter começado a ser usado no final dos anos 80.
Assim, e também para seu crédito, Casey Cadwallader – o diretor criativo da Mugler – está totalmente em sincronia com o DNA da marca, e coerente com a sua estética escultural de cintura de vespa e mega silhueta de ombro.
Além disso, se existe um designer que adorava uma boa festa este era Thierry Mugler. Como alguns de nós que comemoraram o seu 20.º aniversário dentro do Cirque d'Hiver em 1995, com James Brown brincando nas horas livres em meio a rainhas musculosas, exibindo braceletes; como podem testemunhar as atrizes norte-americanas Tippi Hedren e Patty Hearst (ícones do cinema holiodesco) e uma série de supermodelos.
Temos de admitir que Cadwallader tornou esta maison relevante para o século 21. Mesmo se sua inspiração foi mais avatar do que a de Thierry Mugler, que sempre se lembrou de Adrian (Adrian Adolph Greenburg, o figurinista americano famoso pelo filme The Wizard of Oz, ou O Mágico de Oz, e outros entre 1928 e 1941), e dos grandes dias de Hollywood.
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